Pedro Ribeiro*
Tomei o ônibus rumo ao trabalho. Saltei próximo da estação da Sé de Metrô, buscando entrar na linha vermelha em direção ao Vale do Anhangabaú. Não fui a pé, afinal era um daqueles dias de chuva, típico da metrópole. Já sentado no trem, abri um livro do Graciliano Ramos e comecei a ler.
Em alguma estação à frente entrou uma mulher humilde, morena, cabelos molhados provavelmente do banho da manhã, meio ondulados e soltos. Braços musculosos e veias das mãos bem a mostra, sugerindo trabalho duro. O rosto, porém, era extremamente delicado. Não percebi qualquer vestígio de maquiagem. Os lábios carnudos, tipicamente brasileiros, revestidos por um baton bege claro, muito discreto. O vestido era simples, com flores estampadas de baixa qualidade. A barriga um pouco maior que o normal para uma pessoa magra. Diria que era um tipo meio barrigudinho, entretanto me atraí por suas curvas.
O casaco, daqueles bem ordinários, descia até próximo da cintura. Não contava com nenhum enfeite. Os pés maltratados com as veias também à mostra. Os calcanhares estavam tampados pela tira da sandália rosa. As unhas dos pés pintadas de vermelho, única vaidade que notei. Uma bolsa de plástico aparentando couro falso estava pendurada pela alça, bem acomodada em seu ombro esquerdo, que, por sua vez, estava à mostra.
Parei de ler Graciliano para observá-la atentamente. Estava apoiada entre a extremidade do banco à minha frente, do lado oposto no vagão, e a beira da porta. Preocupava-se em manter o resto do corpo um pouco distanciado da parede do trem. Devia ter não mais que vinte e sete anos. Bonita mulher, rosto bem desenhado, contudo sem brilho e expressão. Fiquei tentando adivinhar a sua profissão. Arrisquei que fosse uma empregada doméstica, mas pela hora, quase dez da manhã, ou estava atrasada ou tinha outra profissão.
Enfim, fiquei imaginando o suposto segundo emprego. Não conseguia. A sua barriguinha protuberante me tirava a atenção. Vez por outra, pelo balançar do trem, ela mudava a posição dos pés chamando-me a atenção para sua visível inquietação. Estava com pressa. A teoria do atraso voltou-me à cabeça. O metrô estava cheio; logo, tive dificuldades em continuar analisando-a. Talvez isto me tenha feito ser muito chamativo, e ela percebeu o meu interesse.Olhou-me naturalmente. Apertou mais uma vez os lábios e desviou rapidamente o olhar. Outra vez trocou a posição do pé de apoio e passou a mão direita sobre o cabelo. Aproveitou, ainda, para arrumar a alça da bolsa, que teimava em escorregar de seu ombro esquerdo.
Voltei para a leitura do livro. Não consegui. A morena não parava de vir a minha mente. Resolvi voltar a olhá-la. Não a encontrei. Provavelmente descera em alguma estação durante esse meio tempo. Não pude conter certa frustração.Ajeitei-me no banco, curvei um pouco mais a cabeça e voltei ao livro.Desta vez a leitura correu tranqüilamente.
Bom, a moça não perdi, é claro. Está gravada nesta crônica, segundo pareceu sobre minha visão. Porém nunca passará de uma vaga lembrança, que vez outra invade minha mente. Ou será meu coração?
*´Paulistano, estudante, tem 13 anos de talento.
segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009
A mulher no metrô
Postado por VERA DANTAS às 13:22
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2 comentários:
O texto é lindo, e mostra que o autor fez uma análise detalhada de uma mulher anônima, mas uma análise rica de detalhes e significados. Ele é um cronista nato, que tem um olhar muito humano e educado para a sensibilidade. O metrô oferece um mundo de interpretações que resultam de um olhar centrado na alteridade tão intensa, que revela dimensões do cotidiano.
Olá tudo bem? Adorei o seu texto, além de ser um cronista nato,mostrou ser muito inteligente,humano,sensível,educado.Seus pais devem ter muito orgulho de você!!Continue escrevendo, você vai longe!!Que Deus te ilumine e te proteja para você seguir o caminho do bem.
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