Gladis Costa
Aconteceu!
Numa noite eu tinha 49 anos e no outro dia, acordei com 50. Mas não foi só esta a diferença. Houve uma mudança perceptível dentro de mim, que teve início há alguns meses. Na época não conectei as coisas, mas na manhã do meu aniversário aquela angústia mudou, não que tivesse desaparecido, estava um pouco mais suave, como se o sapinho que a gente engole todos os dias tivesse ficado um pouco menor, ou com um sabor mais suave, ou com as perninhas não tão atravessadas, sabe, foi um pouco melhor.
Ninguém me avisou. Minhas amigas, que passaram por esta fase, ou se prepararam para isto e tiveram uma experiência muito agradável ou simplesmente sabiam que a coisa ia ser dolorida, tão doída que na tentativa de me poupar de saber com antecedência o quanto eu sofreria, preferiram nem me avisar. Não as culpo. Eu também faria o mesmo, porque ninguém merece.
O incrível é que todo o ano ficamos mais velhas, mas desta vez, mudam os dois dígitos e isto é que pega. Porque dos 20 aos 30, por exemplo, é a idade das experiências interessantes, dos romances arrebatadores, dos noivados e casamentos, dos 30 aos 40, você está no auge de sua carreira, seu casamento pode ter acabado e as mais felizes e mais rápidas já engataram num outro relacionamento, dos 40 aos 50, você já ganhou algum dinheiro, tem um bom network, as pessoas te conhecem, você exerce um certo papel no seu grupo, na sua família, enfim, se você está só, muitas vezes é por opção, por não querer alguém perguntando porque você demora tanto pra se arrumar, porque não sai do computador, porque fala tanto ao telefone, enfim, muitas vezes é o momento em que você é dona da sua vida, integralmente.
E agora, o que me espera? Dos 50 aos 60? Porque não consigo deixar de me ver dentro de outro grupo. Daquele grupo. Sei que posso ter um espírito jovem, mas o corpo tem vida própria. Ah, mas você dirá, “o que importa é sua cabeça”. Com certeza, mas sua cabeça é racional, lógica, ela é a primeira a te dizer: agora você faz o que você quer, ou melhor, você só faz o que você quer e se você prefere assistir a uma maratona do seu seriado preferido ao invés de sair com suas amigas, por que não? Qual o problema?
E tem os homens, ah os homens... Se experiência representasse alguma virtude para eles, eu estaria bem feliz. Tenho um amigo que costuma dizer: “Se eu quisesse um cérebro perto de mim, casava com o Einstein”. E hoje, do alto dos meus 50 anos, posso dizer com a boca cheia (ou não, na realidade, morrendo de vergonha): a única coisa que eu tenho é um cérebro, que já me deu alguns sustos no passado, hoje superados (e operados)! Porque, admito, estou fora do peso, uns bons quilos, e o pior, não me sinto culpada, não a ponto de pensar: “pôxa, preciso fazer alguma coisa”, só um pouquinho chateada porque nem todas as roupas legais são feitas para as gordinhas, de resto, troco qualquer sessão de academia por um bom livro. Nesta fase, por exemplo, estou encantada com uma autora portuguesa chamada Margarida Rebelo Pinto, que, depois de Marian Keyes, autora de Melancia, tem sido minha companheira de criado mudo. Margarida é uma notável escritora em seu país. Aqui tem uns três livros publicados e o que eu acabei de ler é “Alma de Pássaro”, lindo, sensível, maravilhoso. Bom, mas nesta fase em que me encontro, toda a obra que aborda o relacionamento difícil e conflituoso entre um homem e uma mulher é lindo, sensível e maravilhoso, portanto, há que se dar um desconto. Ela não é tão descontraída quanto Marian Keyes, mas os elementos estão todos lá: o humor, o sarcasmo, a ironia e esta reflexão sobre o mundo masculino e feminino. Eu já li “Não há coincidências” e “Sei lá” e continuo
Enfim, voltando à versão 5.0 de mim mesma. Este desabado é para falar do medo que estou sentindo por ser uma cinqüentona, mas não daquelas saradas, tipo Vera Fisher ou Sharon Stone, não, apenas uma cinqüentona assustada com o que pode rolar daqui para frente, torcendo para que os homens da minha idade me vejam como alguém do grupo, não alguém que já passou da fase de viver um relacionamento porque, “ela é meio coroa, né?”. Que as empresas me vejam como alguém que pode ensinar, por já ter vivido muito, por já ter passado por várias mudanças e que eu mesma, ao me olhar no espelho, veja lá no fundo uma criança feliz, que cresceu, virou uma garota bacana e agora, depois de tanto tempo, tanta coisa vivida, se transformou numa jovem mulher.
Um comentário:
Gladis:]
Como sempre arrasando...reflexões muito bem fundadas, porque muitas vezes me pego pensando que em 5 anos terei 50 e quanta coisa pode acontecer até lá...
Mas enquanto eles não chegam, a gente vai vivendo a expectativa do momento, mesmo que possa parecer que uma dona de casa não tenha expectativas...tenho sim, e próprias. Descobri que sou feliz, mesmo muitas vezes não sendo, mesmo muitas vezes não devendo,porque a minha felicidade não pode estar calcada nos outros, no marido, filhos, amigos...ela é um sentimento próprio, inerente. E eu sou feliz, mesmo sendo mais gordinha, mesmo com as pessoas me chamando de tia, mesmo vendo que os anos parecem não passar pro meu marido, mesmo com os cabelos cada vez mais brancos. Acho que à medida que os anos vão passando, e que nossa vida vai encurtando, a gente tem que reinventá-la.Tem que pegar o quadro e pintar bem colorido, cheio de luz e sol, e flores e passarinhos cantando...porque apesar de termos sido criados para viver para sempre, e com certeza viveremos de outra maneira, esta vida aqui tem muita coisa boa, muita experiência pra se viver... E a gente pode olhar pra trás e ver
por quanta coisa já passou, quanto já se viveu, quanto já amou, quanto já aprendeu, sofreu, chorou, perdeu, doeu.
E a gente pode rir sarcasticamente dos nossos dramas, rir de tudo isso, porque no fundo a vida é isso mesmo...sopro!!!
Feliz Aniversário de 50 anos, ou seja , meio século, para uma pessoa muito forte, muito linda, muito inteligente e muito feliz!!
Te amo!
Sua cunhada
Solange
♥
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